segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Acho que nem não

"O que vale, são outras coisas. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não misturam..."

- João Guimarães Rosa, em Grande Sertão

sábado, 27 de dezembro de 2014

Guimarães "Daqui" e o Salvador Dali



“Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data. O senhor mesmo sabe."

João Guimarães Rosa

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Pedras Rolando

Sou um cão sem dono
A tecer os fios da canção
Bicho das esquinas
Pedra de amolar
De tirar o limo do som

Sou um trem sem sono
Atravessando a noite do sertão
Força do destino
Fonte do prazer
Ter você na palma da mão

Alguém como você faz acontecer
Alguém que faz bater
Alguém que faz voar de tanto bater
Que nem tambor das pedras rolando
Seja o que for

Reunir a tribo
Repartir viagens sob o sol
Lenha na fogueira
Bucha do balão
Faz a nossa chama arder

Sou um trem cigano
Carregando almas sob o sol
Coração de ouro
Algum calor irmão
Faz o nosso amor crescer

E para sempre é o que tem de ser
Na luz de sua clara presença
Seja o que for

                                           Beto Guedes

Jaco Pastorius e Lavoisier desejam para você...

...Um Feliz Natal

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Em todos os jardins

Em todos os jardins hei-de florir,
Em todos beberei a lua cheia,
Quando enfim no meu fim eu possuir
Todas as praias onde o mar ondeia.

Um dia serei eu o mar e a areia,
A tudo quanto existe me hei-de unir,
E o meu sangue arrasta em cada veia
Esse abraço que um dia se há-de abrir.

Então receberei no meu desejo
Todo o fogo que habita na floresta
Conhecido por mim como num beijo.

Então serei o ritmo das paisagens,
A secreta abundância dessa festa
Que eu via prometida nas imagens

Sofia de Melo Breyner Andresen

domingo, 21 de dezembro de 2014

De verdade...

Logo chegarão bons ventos e esse tempo de lamentos mirrará de inanição.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

E nós...



A clearer future, morning, evening, nights with you




And you and I climb, crossing the shapes of the morning
And you and I reach over the sun for the river
And you and I climb, clearer towards the movement
And you and I called over valleys of endless seas

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Saudações



Que prazer rever-te 
Gozando paz, saúde, amor, felicidade 
Ai, que bom, que tremenda saudade 
Vontade de beijar você 
Cantar, beber, sei lá porque 
Me traga a viola, meu trago, meu gole 
Vamos comemorar 
Nada como regressarmos ao nosso lugar 
Vamos comemorar 
Nada como regressarmos ao nosso lugar 
Ao nosso lar 
Ao nosso bar de fé 
Ver os amigos 
Abraçá-los e chorar de emoção 
Lhes contar boas novas 
Até lavar meu coração do pó 
Das terras onde andei 
Repare em meu peito 
Hoje estou satisfeito 
Cheguei, graças a Deus 
Hoje não há ninguém mais feliz que eu 
Porque cheguei, graças a Deus 
Hoje não há ninguém mais feliz que eu 

Egberto Gismonti

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Acrilic on Canvas

É saudade, então
E mais uma vez
De você fiz o desenho mais perfeito que se fez
Os traços copiei do que não aconteceu
As cores que escolhi entre as tintas que inventei
Misturei com a promessa que nós dois nunca fizemos
De um dia sermos três
Trabalhei você em luz e sombra
E era sempre:
- Não foi por mal, eu juro que nunca quis deixar você tão triste
Sempre as mesmas desculpas
E desculpas nem sempre são sinceras
Quase nunca são
Preparei a minha tela
Com pedaços de lençóis que não chegamos a sujar
A armação fiz com madeira
Da janela do seu quarto
Do portão da sua casa
Fiz paleta e cavalete
E com lágrimas que não brincaram com você
Destilei óleo de linhaça
Da sua cama arranquei pedaços
Que talhei em estiletes de tamanhos diferentes
E fiz, então, pincéis com seus cabelos
Fiz carvão do batom que roubei de você
E com ele marquei dois pontos de fuga
E rabisquei meu horizonte
E era sempre:
- Não foi por mal, eu juro que não foi por mal
Eu não queria machucar você
Prometo que isso nunca vai acontecer mais uma vez
E era sempre, sempre o mesmo novamente
A mesma traição
Às vezes é difícil esquecer:
"Sinto muito, ela não mora mais aqui"

Mas então, por que eu finjo
Que acredito no que invento?
Nada disso aconteceu assim
Não foi desse jeito
Ninguém sofreu
É só você que me provoca essa saudade vazia
Tentando pintar essas flores com o nome
De "amor-perfeito"
E "não-te-esqueças-de-mim"
Legião Urbana

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Eu amo você

Toda vez que eu olho
Toda vez que eu chamo
Toda vez que eu penso
Em lhe dar

O meu amor

Meu coração
(Pensa que não vai ser possível!)
De lhe encontrar
(Pensa que não vai ser possível!)
De lhe amar
(Pensa que não vai ser possível!)
De Conquistá-la
Eu amo você, menina
Eu amo você! Juro...
Eu amo você, menina

Eu amo você!
Tim Maia

sábado, 29 de novembro de 2014

As Musas Cegas - I



Bruxelas, um mês. De pé sob as luzes encantadas.
Em noite assim eu extinguiria minha alma
cantando humildemente. Fecharia os olhos
sob os anéis dos astros, e entre os violinos
e os fortes poços da noite descobriria
a ardente ideia da minha vida.
Em noites assim amaria o fogo
da minha idade. Cantaria como um louco este grande
silêncio do mundo, vendo queimarem-se nas trevas
as vísceras tensas e os ossos e as flores dos nervos
e a cândida e ligeira arquitectura
de uma vida.

Bruxelas com as traves da minha cabeça
e uma grinalda de carvões em torno dos testículos
de um homem
bêbado da sua idade. Cantaria com estes testículos
negros, as lágrimas, o coração ao meio do nevoeiro
derramando o seu baixo e aéreo sangue,
a sua dor, o lírico
fervor, o fogo de porta entre os símbolos nocturnos.

Era tão pura a ideia de que o tempo começava
depois do verde e fértil e exaltado
mês da carne. Vergada sobre o livro onde o meu rosto
ardia,
a vida esperava com sua torres
vibrantes, seus grandes lagos
límpidos. E eu adormecia
e sonhava um homem em voz alta, um vidro
incandescente, uma fina flor
vermelha colocada sobre a mesa. Era tão violenta
a ideia de cantar sem fim,
até que voz consumisse esta garganta sombreada
de estreitos vasos puros.
- Cantar fixa e fria e intensamente
sobre a minha rasa
luminosa vida, ou sobre os campos transparentes e sombrios
de bruxelas do mundo.

Herberto Helder

Esse Beck faz viajar

Jeff Beck - "Blue Wind" live

Um pedaço...


Moro nas fronteiras
Dos teus olhos
Com meu coração

sábado, 22 de novembro de 2014

Um pouco de calor

Saí à toa nessa madrugada
Sem saber porquê
A noite daqui é tão linda e faz me perder
Penso num belo horizonte em poder te ver
Sei que eu não tenho mais nada a perder

Meu carro que não quer mais andar
Essa noite que não quer terminar
Onde está você meu amor?
Eu preciso de um pouco de calor

Saí à toa nessa madrugada
Sem saber porquê
A noite daqui é tão linda e faz me perder
Penso num belo horizonte em poder te ver
Sei que eu não tenho mais nada a perder
Se eu não tenho mais nada a perder
No meu peito eu tenho você
É nessa estrada que eu quero estar
Eu quero o dia, a noite e o mar e cantar

Meu carro que não quer mais andar
Essa noite que não quer terminar
Onde está você meu amor?
Eu preciso de um pouco de calor

                                     だん なかがわ

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Não sou Guimarães, mas gostaria de ter uma Aracy.

“Serás tudo para mim: mulher, amante, amiga e companheira. Sim, querida, hás de ajudar-me, a escrever os nossos livros. Não só passarás à máquina que eu escrever, como poderás auxiliar-me muito. Tu mesma não sabes o que vales. Eu sei, e sempre disse, que tens extraordinário gosto, para julgar coisas escritas. Muito bom gosto e bom senso crítico. Serás, além de inspiradora, uma colaboradora valiosa, apesar ou talvez mesmo por não teres pretensões de ‘literata pedante’. E estaremos sempre juntos, leremos juntos, passearemos juntos, nos divertiremos juntos, envelheceremos juntos, morreremos juntos.”

— João Guimarães Rosa, em carta a Aracy [6/11/1946].

domingo, 16 de novembro de 2014

Tá chegando

“Envelhecer devia de ser bom. A gente ganhando maior acordo consigo mesmo.”

— João Guimarães Rosa, da novela “Buriti”, no livro “Corpo de baile”

sábado, 15 de novembro de 2014

E o destino não quis...

E o meu jardim da vida ressecou, morreu. Do pé que brotou Maria nem Margarida nasceu

terça-feira, 11 de novembro de 2014

O Verdadeiro Amor

"O verdadeiro amor é um calafrio doce, um susto sem perigos."

- João Guimarães Rosa, da novela “Buriti”.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Eurydice

Este é o traço em redor do teu corpo amado e perdido

Para que cercada sejas minha

Este é o canto do amor em que te falo 
Para que escutando sejas minha


Este é o poema – engano do teu rosto 
No qual busco a abolição da morte.



ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner, No Tempo Dividido

domingo, 2 de novembro de 2014

Servidos?

Coragem

"O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem."
JGR

Ele vem aí... e eu estarei lá. Vamos?

Steve Hackett - "Supper`s Ready" live

domingo, 26 de outubro de 2014

II

A Grécia d’Arte, a estranha claridade 
D’aquela Grécia de beleza e graça, 
Passa, cantando, vai cantando e passa 
Dos teus olhos na eterna castidade. 

Toda a serena e altiva heroicidade 
Que foi dos gregos a imortal couraça, 
Aquele encanto e resplendor de raça 
Constelada de antiga majestade, 

Da Atenas flórea toda o viço louro, 
E as rosas e os mirtais e as pompas d’ouro, 
Odisséias e deuses e galeras... 

Na sonolência de uma lua aziaga, 
Tudo em saudade nos teus olhos vaga, 
Canta melancolias de outras eras!...


Cruz e Sousa

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

domingo, 19 de outubro de 2014

Musa

Musa ensina-me o canto
Venerável e antigo
O canto para todos
Por todos entendido

Musa ensina-me o canto
O justo irmão das coisas
Incendiador da noite
E na tarde secreto

Musa ensina-me o canto
Em que eu mesma regresso
Sem demora e sem pressa
Tornada planta ou pedra

Ou tornada parede
Da casa primitiva
Ou tornada o murmúrio
Do mar que a cercava

(Eu me lembro do chão
De madeira lavada
E do seu perfume
Que atravessava)

Musa ensina-me o canto
Onde o mar respira
Coberto de brilhos
Musa ensina-me o canto
Da janela quadrada
E do quarto branco

Que eu possa dizer como
A tarde ali tocava
Na mesa e na porta
No espelho e no corpo
E como os rodeava

Pois o tempo me corta
O tempo me divide
O tempo me atravessa
E me separa viva
Do chão e da parede
Da casa primitiva

Musa ensina-me o canto
Venerável e antigo
para prender o brilho
Dessa manhã polida
Que poisava na duna
Docemente os seus dedos
E caiava as paredes
Da casa limpa e branca

Musa ensina-me o canto
Que me corta a garganta

Sophia de Mello Breyner Andresen